O Brasil e os Negros

09/05/2011 14:50

 

O Brasil e os Negros

Profº Dermeval Corrêa de Andrade*

Para quem pretende compreender a situação atual dos negros, no Brasil, deve,  irremediavelmente, ater-se a  dois pontos que são determinantes: a escravidão objetiva que explorou e matou milhões de nossos ancestrais — por mais de 3 séculos — e a forte  rede subjetiva* que persiste, até hoje, a nos manter distantes dos melhores postos de trabalho e, consequentemente, engessando-nos em classes  sociais economicamente precárias.

 

Em outras palavras, o fim da escravidão não foi suficiente para implantar a democracia étnica, pois foi instalada contra nós uma ditadura econômica, mesmo dentro da chamada “democracia moderna”. Essas discriminações são exercidas sutilmente dentro dos aparatos de saúde, escolar, religioso, político, jurídico, profissional etc. Tudo camuflado por uma paz, na realidade, injusta.

 

Os ideólogos poderão dizer que há muitas situações em que os negros são colocados em condições de igualdade para disputar concursos públicos, vestibulares e, no entanto, perdem para a concorrência. Vejam que as causas do fracasso não estão na menor vontade ou inteligência dos negros, mas sim na perversidade do sistema escolar. Este modelo destina uma cota acima de 90%  dos melhores cursos e altos cargos aos brancos que, assim, vão assumindo  privilegiados postos profissionais. Os mecanismos discriminatórios se sofisticam nos estamentos mais altos da sociedade. Na base, quase não são utilizados institucionalmente; deixando para outros pobres aplicá-los.

 

É importante citar algumas atividades que não dependem da escolaridade de “qualidade”. É o caso dos atletas, cuja atuação, facilitada pelo biótipo peculiar, implica na capacidade física e

habilidade psicomotora, ou seja, a formação escolar não é prioritária. Outra atividade que exige talento e criatividade é a do artista, principalmente na música e participações no Carnaval. Nessas atividades somos “top de linha’, não por sermos melhores que outras etnias, mas porque os inimigos da igualdade “cochilaram”, avaliando que se tratava de áreas apenas lúdicas da atividade humana e, no início, desvalorizadas socialmente.

 

Caros leitores, vejam que a rede invisível  tem determinado grande parte dessa exclusão sócio-étnica. Principalmente depois do advento do “politicamente correto”, ninguém assume as discriminações, mas disfarça a situação com remendos em leis que, nem sempre, são aplicadas devidamente. Negam que as oportunidades que lhes dão são, na realidade, o funil-social, a única saída. Providenciam a inclusão de vários “bonzinhos” nos meios de comunicação etc. Mas, apesar de alguns avanços nesse jogo dialético da cultura, persiste a rede invisível da discriminação não declarada, das explicações equivocadas sobre nossos insucessos; enfim, vocês entenderão porque, aqui no Brasil, nossa etnia vive seis anos menos que as demais. É que continuam a abater nossos jovens a tiros ou a nos conter com mecanismos não vistos pela cegueira conveniente dos que estão levando vantagem sobre nós ou aqueles nossos parentes que, ainda alienados, esperam benesses que caiam milagrosamente do Céu.

 

* "As realidades podem ser objetivas ou subjetivas, ambas podem exercer papéis com a mesma finalidade e eficácia. "

Prof. Dermeval Corrêa de Andrade é psicólogo, presidente do Instituto Argumentos, Elaborador e Articulador da Psicologia da Ideologia, Consultor em Cultura, Educação e Saúde, escritor de livros, dentre eles Psicologia da Ideologia, Educação Social Transformadora e Compreendendo o Autismo.